Agonizar no on line da voragem
Nestes longos dias de reclusão e isolamento,
A alma enclausurada nos tormentos da dor
Das perdas inglórias e que a morte leva de raspão,
Estes sentidos apertos, imensos de tão intensos,
São vórtices, báratros, turbilhões abismais
Agigantados nas entranhas do ser
Que se revelam em pungentes sensações.
A memória, desgastada no tempo,
Descortina redutos efémeros, de marcas fundas,
Feios vincos, pesados sulcos de fel,
Que de tão intrincadamente obscuros,
Mal se ocultarão de outros olhares,
No escoar da ampulheta contando os segundos.
Como encobrir as pregas, as rugas, as gelhas
Deste tão inenarrável e desmesurado sofrimento?
Como enfrentar o devir com esta difusa luz,
Raiado de ocres luminescências e travos amargos
Patentes nos rostos cinzentos, fechados,
Com máscaras hipóxicas e viseiras certificadas?!
Tem-se uma vida inquieta, visceralmente aflita,
Que entrementes se confunde e até se ofende
Com a existência de alguns infelizes,
Mais sós, tristes e desafortunados,
Sem tectos, nem amparos, nem aconchegos.
Mas, ainda que sem nada que os acolha,
Vivem como se não houvesse amanhã…
Que desatino é este desalinho de sentir!
O coração quer olvidar o que a alma mal divisa,
Mas que ofuscada, intui, pelo sem sentido da vida.
Nada mais parece ter jeito ou sequer significado.
O ser emudece num gigantesco e profundo mal-estar,
E, a vida agoniza no on line da voragem intersticial,
Cansada da aragem lúgubre de um futuro imperceptível,
Estranha e surpreendemente inimaginável.
06-04-2020/07-05-2020